Tatiana Belinky é a autora desta peça e de muitas outras! Esta autora escreveu para o público infantil e infanto-juvenil, somando mais de 250 obras e tendo recebido importantes prêmios nacionais e internacionais, como o Prêmio Jabuti, em 1989. Alguns de seus livros são “Olhos de ver”, “O caso do bolinho”, “O grande rabanete”, “Tatu na casca”, “Transplante de menina” e “O livro das tatianices”.
Nesta peça podemos conhecer a história de Mujim, o Caramujo e Lelé, a Lesminha.
Com humor e delicadeza, a peça aborda conflitos presentes na vida de qualquer casal, estabelecendo paralelo com os personagens do mundo animal.
É um texto que pode ser explorado com crianças de várias idades, pela aproximação entre as crianças e os animais, além das situações cômicas presentes no enredo.
Leia um pequeno trecho para dar vontade de mais:
“Mujim: Fofinha… acho que escutei você cantando que é solteira?
Lelé: Eu sou mesmo
Mujim (animado): Eu também…
Lelé (fiteira): Que coincidência! (Rebola um pouco)
Mujim: Feliz coincidência! Que me deu uma linda ideia
Lelé (que já sabe o que é): Que ideia Mujim? Não faço ideia…
Mujim: É que… já que somos ambos solteiros… que tal se… (decidido) – Assim que a vi, fiquei apaixonado, Lelé. Lelezinha, quer casar comigo?”
Para saber como continua, você terá que ler toda a peça!
Falar das peças de Willian Shakespeare é fácil! Não porque seus textos sejam simples ou porque sejam poucos, mas porque são bons! E como meu propósito nesta aba desse blog é fazer com que você tenha vontade de ler dramaturgia, este autor me deixa com muitos argumentos para te convencer.
Das peças escritas por Shakespeare, 38 chegaram até os dias atuais. Tendo vivido entre os anos de 1564 e 1616, na Inglaterra, foi diretor de um teatro “O Globe” e é o principal representante das obras deste período na Europa, ainda que tenhamos outras formas teatrais também importantes no Renascimento.
Shakespeare escreveu tragédias e comédias, além de dramas históricos. Seus personagens são bastante conhecidos, sendo possivelmente a frase de Hamlet “Ser ou não ser, eis a questão” uma das mais conhecidas de toda a dramaturgia mundial, mesmo considerando o fato de que muitas pessoas que conhecem a frase nunca tenham lido nenhuma de suas peças.
Escolhi sua peça mais famosa: Romeu e Julieta! Minha escolha deve-se ao fato de adorar esta história e este texto. Considero uma boa aproximação ao autor, mas somente se você for alguém que se interesse por histórias de amor. Se não for, leia outra, pode ser Hamlet ou Rei Lear se quiser uma tragédia, ou fique com A megera Domada ou Sonhos de uma noite de verão, caso prefira uma comédia!
A história de Romeu e Julieta dispensa explicações, mas caso você nunca tenha ouvido falar aí vai uma brevíssima explicação: a peça conta o encontro de dois jovens, de famílias que se odeiam e que, por diferentes desencontros terminarão morrendo.
A tragédia da impossibilidade de viver esta paixão nos envolve e faz com que o sofrimento vivido pelos dois possa ser reconhecido, ainda que você tenha se apaixonado somente por pessoas permitidas.
Para além da história bem tramada, o texto é de uma beleza fascinante, destes que nos fazem agradecer a felicidade que é poder ler e imaginar!
Escolhi uma cena, a famosa cena do balcão e não consegui postar somente um pedaço, então aproveite e leia a cena completa! Depois de ler, consiga o texto na íntegra e se delicie, com direito a lágrimas no final.
ROMEU E JULIETA, ATO II, Cena II
O mesmo. Jardim de Capuleto. Entra Romeu.
ROMEU – Só ri das cicatrizes quem ferida nunca sofreu no corpo. (Julieta aparece na janela.) Mas silêncio! Que luz se escoa agora da janela? Será Julieta o sol daquele oriente? Surge, formoso sol, e mata a lua cheia de inveja, que se mostra pálida e doente de tristeza, por ter visto que, como serva, és mais formosa que ela. Deixa, pois, de servi-la; ela é invejosa. Somente os tolos usam sua túnica de vestal, verde e doente; joga-a fora. Eis minha dama. Oh, sim! é o meu amor. Se ela soubesse disso! Ela fala;
contudo, não diz nada. Que importa? Com o olhar está falando. Vou responder-lhe. Não; sou muito ousado; não se dirige a mim: duas estrelas do céu, as mais formosas, tendo tido qualquer ocupação, aos olhos dela pediram que brilhassem nas esferas, até que elas voltassem. Que se dera se ficassem lá no alto os olhos dela, e na sua cabeça os dois luzeiros? Suas faces nitentes deixariam corridas as estrelas, como o dia faz com a luz das candeias, e seus olhos tamanha luz no céu espalhariam, que os pássaros, despertos, cantariam. Vede como ela apoia o rosto à mão. Ah! se eu fosse uma luva dessa mão, para poder tocar naquela face!
JULIETA – Ai de mim!
ROMEU – Oh, falou! Fala de novo, anjo brilhante, porque és tão glorioso para esta noite, sobre a minha fronte, como o emissário alado das alturas ser poderia para os olhos brancos e revirados dos mortais atônitos, que, para vê-lo, se reviram, quando montado passa nas ociosas nuvens e veleja no seio do ar sereno.
JULIETA – Romeu, Romeu! Ah! por que és tu Romeu? Renega o pai, despoja-te do nome; ou então, se não quiseres, jura ao menos que amor me tens, porque uma Capuleto deixarei de ser logo.
ROMEU (à parte) – Continuo ouvindo-a mais um pouco, ou lhe respondo?
JULIETA – Meu inimigo é apenas o teu nome. Continuarias sendo o que és, se acaso Montecchio tu não fosses. Que é Montecchio? Não será mão, nem pé, nem braço ou rosto, nem parte alguma que pertença ao corpo. Sê outro nome. Que há num simples nome? O que chamamos rosa, sob uma outra designação teria igual perfume. Assim Romeu, se não tivesse o nome de Romeu, conservara a tão preciosa perfeição
que dele é sem esse título. Romeu, risca teu nome, e, em troca dele, que não é parte alguma de ti mesmo, fica comigo inteira.
ROMEU – Sim, aceito tua palavra. Dá-me o nome apenas de amor, que ficarei rebatizado. De agora em diante não serei Romeu.
JULIETA – Quem és tu que, encoberto pela noite, entras em meu segredo?
ROMEU – Por um nome não sei como dizer-te quem eu seja. Meu nome, cara santa, me é odioso, por ser teu inimigo; se o tivesse diante de mim, escrito, o rasgaria.
JULIETA – Minhas orelhas ainda não beberam cem palavras sequer de tua boca, mas reconheço o tom. Não és Romeu, um dos Montecchios?
ROMEU – Não, bela menina; nem um nem outro, se isso te desgosta.
JULIETA – Dize-me como entraste e porque vieste. Muito alto é o muro do jardim, difícil de escalar, sendo o ponto a própria morte – se quem és atendermos – caso fosses encontrado por um dos meus parentes.
ROMEU – Do amor as lestes asas me fizeram transvoar o muro, pois barreira alguma conseguirá deter do amor o curso, tentando o amor tudo o que o amor realiza. Teus parentes, assim, não poderiam desviar-me do propósito.
JULIETA – No caso de seres visto, poderão matar-te.
ROMEU – Ai! Em teus olhos há maior perigo do que em vinte punhais de teus parentes. Olha-me com doçura, e é quanto basta para deixar-me à prova do ódio deles.
JULIETA – Por nada deste mundo desejara que fosses visto aqui.
ROMEU – A capa tenho da noite para deles ocultar-me. Basta que me ames, e eles que me vejam! Prefiro ter cerceada logo a vida pelo ódio deles, a ter morte longa, faltando o teu amor.
JULIETA – Com quem tomaste informações para até aqui chegares?
ROMEU – Com o amor, que a inquirir me deu coragem;. deu-me conselhos e eu lhe emprestei olhos. Não sou piloto; mas se te encontrasses tão longe quanto a praia mais extensa que o mar longínquo banha, aventurara-me para obter tão preciosa mercancia.
JULIETA – Sabe-lo bem: a máscara da noite me cobre agora o rosto; do contrário, um rubor virginal me pintaria, de pronto, as faces, pelo que me ouviste dizer neste momento. Desejara – oh! minto! – retratar-me do que disse. Mas fora! fora com as formalidades! Amas-me? Sei que vais dizer-me “sim”, e creio no que dizes. Se o jurares, porém, talvez te mostres inconstante, pois dos perjúrios dos amantes,
dizem, Jove sorri. Ó meu gentil Romeu! Se amas, proclama-o com sinceridade; ou se pensas, acaso, que foi fácil minha conquista, vou tornar-me ríspida, franzir o sobrecenho e dizer “não”, porque me faças novamente a corte. Se não, por nada, nada deste mundo. Belo Montecchio, é certo: estou perdida, louca de amor; daí poder pensares que meu procedimento é assaz leviano; mas podeis crer-me, cavalheiro, que
hei de mais fiel mostrar-me do que quantas têm bastante astúcia para serem cautas. Poderia ter sido mais prudente, preciso confessá-lo, se não fosse teres ouvido sem que eu percebesse, minha veraz paixão. Assim, perdoa-me, não imputando à leviandade, nunca, meu abandono pronto, descoberto tão facilmente pela noite escura.
ROMEU – Senhora, juro pela santa lua que acairela de prata as belas frondes de todas estas árvores frutíferas…
JULIETA – Não jures pela lua, essa inconstante, que seu contorno circular altera todos os meses, porque não pareça que teu amor, também, é assim mudável.
ROMEU – Por que devo jurar?
JULIETA – Não jures nada, ou jura, se o quiseres, por ti mesmo, por tua nobre pessoa, que é o objeto de minha idolatria. Assim, te creio.
ROMEU – Se o amor sincero deste coração…
JULIETA – Pára! não jures; muito embora sejas toda minha alegria, não me alegra a aliança desta noite; irrefletida foi por demais, precipitada, súbita, tal qual como o relâmpago que deixa de existir antes que dizer possamos: Ei-lo! brilhou! Boa noite, meu querido. Que o hálito do estio amadureça este botão de amor, porque ele possa numa flor transformar-se delicada, quando outra vez nos virmos. Até à vista; boa
noite. Possas ter a mesma calma que neste instante se me apossa da alma.
ROMEU – Vais deixar-me sair mal satisfeito?
JULIETA – Que alegria querias esta noite?
ROMEU – Trocar contigo o voto fiel de amor.
JULIETA – Antes que mo pedisses, já to dera; mas desejara ter de dá-lo ainda.
ROMEU – Desejas retirá-lo? Com que intuito, querido amor?
JULIETA – Porque, mais generosa, de novo to ofertasse. No entretanto, não quero nada, afora o que possuo. Minha bondade é como o mar: sem fim, e tão funda quanto ele. Posso dar-te sem medida, que muito mais me sobra: ambos são infinitos.
(A ama chama dentro.)
Ouço bulha dentro de casa. Adeus, amor! Adeus! – Ama, vou já! – Sê fiel, doce Montecchio. Espera um momentinho; volto logo.
(Retira-se da janela.)
ROMEU – Oh! que noite abençoada! Tenho medo, de um sonho, lisonjeiro em demasia para ser realidade.
(Julieta torna a aparecer em cima.)
JULIETA – Romeu querido, só três palavrinhas, e boa noite outra vez. Se esse amoroso pendor for sério e honesto, amanhã cedo me envia uma palavra pelo próprio que eu te mandar: em que lugar e quando pretendes realizar a cerimônia, que a teus pés deporei minha ventura, para seguir-te pelo mundo todo como a senhor e esposo.
AMA (dentro) – Senhorita!
JULIETA – Já vou! Já vou! – Porém se não for puro teu pensamento, peço-te…
AMA (dentro) – Menina!
JULIETA – Já vou! Neste momento! – … que não sigas com tuas insistências e me deixes entregue à minha dor. Amanhã cedo te mandarei recado por um próprio.
ROMEU – Por minha alma…
JULIETA – Boa noite vezes mil.
(Retira-se.)
ROMEU – Não, má noite, sem tua luz gentil. O amor procura o amor como o estudante que para a escola corre: num instante. Mas, ao se afastar dele, o amor parece que se transforma em colegial refece.
(Faz menção de retirar-se.)
(Julieta torna a aparecer em cima.)
JULIETA – Psiu! Romeu, psiu! Oh! quem me dera o grito do falcoeiro, porque chamar pudesse esse nobre gavião! O cativeiro tem voz rouca; não pode falar alto, senão eu forçaria a gruta de Eco, deixando ainda mais rouca do que a minha sua voz aérea, à força de cem vezes o nome repetir do meu Romeu.
ROMEU – Minha alma é que me chama pelo nome. Que doce som de prata faz a língua dos amantes à noite, tal qual música langorosa que ouvido atento escuta?
JULIETA – Romeu!
ROMEU – Minha querida?
JULIETA – A que horas, cedo, devo mandar alguém para falar-te?
ROMEU – Às nove horas.
JULIETA – Sem falta. Só parece que até lá são vinte anos. Esqueci-me do que tinha a dizer.
ROMEU – Deixa que eu fique parado aqui, até que te recordes.
JULIETA – Esquecê-lo-ia, só para que sempre ficasses ai parado, recordando-me de como adoro tua companhia.
ROMEU – E eu ficaria, para que esquecesses, deixando de lembrar-me de outra casa que não fosse esta aqui.
JULIETA – É quase dia; desejara que já tivesses ido, não mais longe, porém, do que travessa menina deixa o meigo passarinho, que das mãos ela solta – tal qual pobre prisioneiro na corda bem torcida – para logo puxá-lo novamente pelo fio de seda, tão ciumenta e amorosa é de sua liberdade.
ROMEU – Quisera ser teu passarinho.
JULIETA – O mesmo, querido, eu desejara; mas de tanto te acariciar, podia, até, matar-te. Adeus; calca-me a dor com tanto afã, que boa-noite eu diria até amanhã.
ROMEU – Que aos teus olhos o sono baixe e ao peito. Fosse eu o sono e dormisse desse jeito! Vou procurar meu pai espiritual, para um conselho lhe pedir leal.
(Sai.)
Bertold Brecht foi mais do que um autor de peças teatrais– foi também um teórico sobre o teatro, um encenador e diretor. Para falar sobre ele seria necessário mais do que um post, mas você poderá conhecer sua obra nos muitos livros de sua autoria publicados, além da enorme diversidade de escritos sobre tudo o que ele fez.
Escolhi falar de uma peça de que eu gosto muito, Círculo de giz caucasiano.
Esta peça, escrita em 1944, se passa na antiga União Soviética. No enredo acompanhamos a disputa entre a mãe biológica de uma criança, Miguel, e a mulher que o criou quando a mãe, Grusche, o abandonou. Por diferentes motivos, que você só saberá lendo a peça, as duas entram em disputa pela guarda.
O juiz decide que ficará com Miguel aquela que conseguir tirá-lo de um círculo de giz traçado no chão, puxando-o com força pelo braço, cada uma de um lado do círculo. Quer saber como este conflito termina? Leia toda a peça!
As fotos utilizadas neste post foram retiradas de: http://www.companhiadolatao.com.br/site/o-circulo-de-giz-caucasiano/
Para que sua vontade de ver a peça aumente, aí vai um pequeno trecho, retirado da Edição do Teatro Completo de Bertold Brecht, número 9, feito pela Editora Paz e Terra:
“Entram as três no caravançará. Do outro lado do palco aparece ao fundo o Criado com umas trouxas. Atrás dele vai a Velha Dama, depois a Jovem e Grusche com o Menino.
JOVEM DAMA: Cento e oitenta piastras! Nunca fiquei tão irritada, desde o dia em que o meu querido Igor foi tirado à força de casa.
VELHA DAMA: Acha que é hora de falar no Igor?
JOVEM DAMA: Na verdade, somos quatro pessoas: porque o menino também é gente, não é? (A Grusche) A senhora não poderia pagar pelo menos a metade do aluguel?
GRUSCHE: Impossível. As senhoras estão vendo, eu tive de sumir às pressas e o Ajudante de Ordem esqueceu de me dar dinheiro suficiente.
VELHA DAMA: A senhora não tem nem sessenta piastras?
GRUSCHE: Depois eu pago.
JOVEM DAMA: E as camas, onde estão?
CRIADO: Cama, não tem. Aqui estão os sacos e as cobertas. E as senhoras têm de arrumar tudo sózinhas, dando-se por muito felizes por não estarem no fundo de uma vala, como tantos outros. (Sai.)
JOVEM DAMA: Ouviu isso? Vamos imediatamente falar com o estalajadeiro! Esse criado precisa é de umas chibatadas.
VELHA DAMA: Como o seu marido?
JOVEM DAMA: Você é tão cruel! (Chora)
VELHA DAMA: Como é que nós vamos fazer com isto alguma coisa que pareça uma cama?
GRUSCHE: Eu já dou um jeito. (Põe o Menino sentado no chão.) A gente aprende a fazer muitas coisas, as senhoras ainda têm a carruagem. (Limpando o chão) Para mim, foi tudo uma surpresa tola. Antes do almoço, meu marido ainda me disse:“Minha querida Anastácia Katarinówska, vá deitar-se um pouco, você sabe que não custa pegar uma enxaqueca!” (Estende os sacos e faz as camas; as duas Damas, vendo-a trabalhar, entreolham-se,) Eu disse ao Governador: “Grégori, nós estamos com sessenta convidados para almoçar, e eu não tenho tempo de me deitar, a gente não pode confiar na criadagem e o Miguel Georgivitch não pode passar sem mim,” (Ao Menino): Está vendo, Miguel? Tudo se arranja: é como eu disse a você! (Percebe, de repente, que as duas Damas a observam curiosamente e cochicham.) E assim não é mais no chão duro que vamos dormir: eu fiz um forro com os cobertores dobrados.
VELHA DAMA (autoritária): Você faz camas bem demais, querida: deixe ver suas mãos!
GRUSCHE (assustada) Que está querendo dizer?
JOVEM DAMA: Pode mostrar suas mãos a ela.
Grusche mostra as mãos às Damas.
JOVEM DAMA (triunfante): Cheia de calos! É da criadagem!
VELHA DAMA (vai até a porta e grita): Atendam aqui!
JOVEM DAMA: Foi apanhada, sua impostora! Vá dizendo o que estava planejando!
GRUSCHE: Eu não estava planejando nada. Pensei que as senhoras talvez nos pudessem dar uma boa carona em sua carruagem. Por favor, não façam barulho: já estou indo embora!
JOVEM DAMA (enquanto a Velha Dama continua a chamar gente): Você vai, sim, mas é com a polícia. Enquanto ela não chega, você fica. Não me saia daqui!
GRUSCHE: Mas eu ia pagar as sessenta piastras. Podem ver: tenho dinheiro aqui! (Mostra a bolsa.) Quatro pratas de dez e uma de cinco, não, mais uma de dez, somam sessenta. Eu só queria botar o menino na carruagem, estou falando a verdade.
JOVEM DAMA: Então queria ir de carruagem? Pois agora acabou-se!
GRUSCHE: Nobre senhora, eu juro: minha origem é pobre, por favor, não chame a polícia! O menino é de alto berço, veja a roupinha dele: é um fugitivo, como as senhoras!
JOVEM DAMA: Está-se vendo que é de alto berço. E o pai é um príncipe?
GRUSCHE (furiosa, à Velha Dama): Pare de gritar! Será que não tem coração?
JOVEM DAMA (à Velha): Cuidado, ela é capaz de tudo, é perigosa! Socorro! Assassinos!
CRIADO (Aparecendo): Que está havendo aqui?
VELHA DAMA: Essa rapariga enfiou-se aqui, bancando a grande dama: talvez seja uma ladra.
JOVEM DAMA: E das mais perigosas. Queria nos matar. É um caso de polícia. Estou sentindo a minha enxaqueca chegar, ah, meu Deus!
CRIADO: Polícia, no momento, não existe. (A Grusche). Arrume suas coisas, boneca, e desapareça que nem salsicha do armário!
GRUSCHE (encolerizada, pondo o Menino no colo): Seus desumanos! Hei de ver as cabeças de vocês penduradas no muro!
CRIADO (enxotando-a para fora): Cale esse bico! Senão, o patrão vem aí, e com ele não tem meias medidas.
VELHA DAMA ( à Jovem): Dê uma espiada, se ela já não furtou alguma coisa!
Enquanto as Damas, à direita, verificam se nada lhes foi roubado, o Criado e Grusche encaminham-se para a saída, à esquerda.”
Neste trecho é possível observar uma das características da obra de Brecht: a análise sobre as diferentes questões sociais presentes na época em que ele viveu (1898 – 1956) e que ainda são muito presentes na atualidade! Muito mais do que eu, ele e provavelmente você, gostaríamos.
Esta peça foi escrita por Pedro Bandeira, autor de inúmeros livros infantojuvenis e desta peça divertidíssima! Se a primeira postagem que fiz sugeriu um texto difícil de ler, pela linguagem nele utilizada, esta é fácil, seja pela linguagem, seja pelo fato de se tratar de personagens conhecidíssimos, princesas de diversos contos de fadas.
A peça se passa muito tempo depois do “Felizes para sempre…” e mostra o que aconteceu com as princesas depois de muitos anos de casadas! Como muitos livros de Pedro Bandeira, existe um mistério a ser descoberto, que você só irá descobrir lendo a peça.
No salão do castelo, Dona Branca Encantado está sentada em sua cadeira de espaldar alto, tricotando um sapatinho de lã. Está visivelmente grávida. Entra Caio, o lacaio. Curva-se respeitosa e espalhafatosamente e anuncia:
Caio: Alteza, a senhorita Vermelho acaba de chegar ao castelo e pede…
Branca: Chapeuzinho Vermelho? Que ótimo! Peça que entre. Vamos, Caio, rápido!
Caio inclina-se, afasta-se um pouco e estende o braço, ainda inclinado, em direção à porta. Entra Dona Chapeuzinho Vermelho. O papel deve ser feito por uma atriz bem pequena, talvez algo gorducha, de boa veia cômica. Está vestida como Chapeuzinho Vermelho e traz pendurada no braço a famosa cestinha com os doces para a Vovó. Dona Branca corre para abraçar a amiga.
Branca: Chapeuzinho Vermelho! Querida! Há quanto tempo! Como vai a Vovozinha?
Chapéu: Branca!
As duas dão-se três beijinhos nas faces.
Chapéu: Um… dois… e três! Pra ver se eu caso, Branca! Ai, ai! Sou uma das poucas neste País das Fadas que não é princesa! Também… você sabe, não é?
Branca: Sei, Chapéu! A sua história terminou dizendo que você ia ser feliz para sempre ao lado da Vovozinha e o autor esqueceu de fazer aparecer um Príncipe Encantado no final pra casar com você. Por isso, você ficou encalhada…
Chapéu: Também não precisa falar assim… Eu estou solteira mas… Quem sabe, não é?
Branca: Ora, você tem a Vovó para lhe fazer companhia…
Chapéu: E quem quer uma avó caduca daquelas? Eu quero é um príncipe!
Dona Branca olha fixamente para Chapeuzinho, tentando confortá-la.
Branca: Coragem, Chapeuzinho!
Chapéu: Branca, por que você tem esses olhos tão grandes?
Branca: Ora, deixe de besteira, Chapéu!
Chapéu: Ahn… quer dizer… Desculpe, Branca. É que eu sempre me distraio… Sabe? Estou sempre pensando na minha história. Não fosse a falta do príncipe… A minha história é tão linda, com o Lobo Mau, tão terrível, e o Caçador, tão valente…
Branca: Até que a sua história é passável, Chapéu. Mas linda mesmo é a minha, que tem espelho mágico, maçã envenenada, bruxa malvada, anõezinhos e até caçador generoso!
Escolher de qual autor brasileiro será meu primeiro post não foi tarefa fácil. O bom é sabermos que temos tantos para ler! Escolhi Nelson Rodrigues, e a peça foi Vestido de noiva.
Não há dúvida de que Nelson Rodrigues é um autor polêmico, tão polêmico quanto reconhecido. Escreveu muitas peças, que Sábato Magaldi classifica em peças psicológicas, peças mitológicas e tragédias cariocas. Mas Nelson também escreveu crônicas e outros diversos gêneros textuais.
Seus textos apresentam diferentes facetas das relações humanas, no que diz respeito às relações sociais, a suas regras e costumes, aos conflitos familiares e à psique humana. As muitas tramas vividas por seus personagens envolvem o amor, o sexo, as brigas, a angústia! Não há como ter dúvida de que a vida corre de forma pulsante nas obras deste autor. Talvez você, leitor, considere que a sua própria vida é mais simples, sem tantos conflitos, sem tanta angústia. Será?
Vestido de noiva teve uma encenação marcante para o teatro brasileiro, que foi a dirigida por Ziembinski, em 1943, de que reproduzimos a foto anterior. De lá para cá já houve muitas outras, feitas por grupos e atores importantes no teatro nacional.
A peça se passa em três planos que se intercalam: o plano da alucinação, o plano da realidade e o plano da memória. Como uma boa peça rodrigueana, acompanhamos os conflitos de Alaíde e a relação com sua irmã, perpassada pela paixão por um mesmo homem.
Se as tramas propostas são imbricadas, o texto é fluido, fácil de ler, de mergulharmos nestas relações. É um texto escrito para teatro que nos permite imaginar as cenas. São tantas as possibilidades de imaginarmos soluções para montagens, que sempre podemos ver mais uma!
(2 mesas e 3 mulheres desaparecem. Duas mulheres – levam 2 cadeiras. As duas mesas são puxadas para cima. Surge na escada uma mulher. Espartilhada, chapéu de plumas. Uma elegância antiquada de 1905. Bela figura. Luz sobre ela.)
MADAME CLESSI – Vou botar um disco. (dirige-se para a invisível vitrola, com Alaíde atrás.)
ALAÍDE – A senhora não morreu?
MADAME CLESSI – Vou botar um samba. Esse aqui não é muito bom. Mas vai assim mesmo. (Samba surdinando.)
MADAME CLESSI – Está vendo como estou gorda, velha, cheia de varizes e de dinheiro?
ALAÍDE – Li o seu diário.
MADAME CLESSI (céptica) – Leu? Duvido! Onde?
ALAÍDE (afirmativa) – Li, sim. Quero morrer agora mesmo, se não é verdade!
MADAME CLESSI – Então diga como é que começa. (Clessi fala de costas para Alaíde)
ALAÍDE (recordando) – Quer ver? É assim… (ligeira pausa) “ontem, fui com Paulo a Paineiras”… (feliz) É assim que começa.
MADAME CLESSI (evocativa) Assim mesmo. É.
ALAÍDE (perturbada) – Não sei como a senhora pôde escrever aquilo! Como teve coragem! Eu não tinha!
MADAME CLESSI (à vontade) – Mas não é só aquilo. Tem outras coisas.
ALAÍDE (excitada) – Eu sei. Tem muito mais. Fiquei!… (inquieta) Meu Deus! Não sei o que é que eu tenho. É uma coisa – não sei. Por que é que eu estou aqui?
MADAME CLESSI – É a mim que você pergunta?
ALAÍDE (com volubilidade) – Aconteceu uma coisa, na minha vida, que me fez vir aqui. Quando foi que ouvi seu nome pela primeira vez? (pausa) Estou-me lembrando! (Entra o cliente anterior com guarda-chuva, chapéu e capa. Parece boiar.)
ALAÍDE – Aquele homem! Tem a mesma cara do meu noivo!
MADAME CLESSI – Deixa o homem! Como foi que você soube do meu nome?
ALAÍDE – Me lembrei agora! (noutro tom) Ele está-me olhando. (noutro tom, ainda) Foi uma conversa que eu ouvi quando a gente se mudou. No dia mesmo, entre papai e mamãe. Deixe eu me recordar como foi. Já sei! Papai estava dizendo: “O negócio acabava…” (Escurece o plano da alucinação. Luz no plano da memória. Aparecem pai e mãe de Alaíde.)
Escolhi como texto para este primeiro post uma peça pela qual me apaixonei enquanto lia. A história é bastante conhecida e muitas montagens já foram feitas dela, afinal, é um dos mais antigos registros de textos teatrais da história ocidental.
Édipo Rei foi escrito por Sófocles por volta de 427 a.C., na Grécia Antiga. É parte de uma trilogia, isto é, três peças que se relacionam, embora seja possível compreender cada uma delas em separado.
A linguagem utilizada pode soar estranha quando começamos a ler, mas conforme seguimos, a história nos envolve de tal forma, que a maneira pela qual foi escrita deixa de ser uma dificuldade. Mas quem nunca leu um texto antigo precisa insistir, pois demora um pouco para engrenar.
De forma muito resumida, podemos dizer que nesta história Édipo mata seu pai e se apaixona por sua mãe, Jocasta, casando-se com ela. Mas o que interessa, como sempre acontece com as boas histórias, é como isso aconteceu. Na leitura do texto podemos acompanhar todo o sofrimento de Édipo e de Jocasta na busca da verdade da história da vida deles, e após sua descoberta, o terror que sentem por terem cometido ato tão pavoroso quanto o incesto de mãe e filho.
Um dos personagens centrais desta peça é Tirésias, o profeta que irá ajudá-los nesta descoberta avassaladora. Podemos ler um pequeno trecho do diálogo de Tirésias com Édipo.
O CORO: Acaba de chegar quem tudo nos vai descobrir! Trazem aqui o divino profeta, o único, entre todos os homens, que sabe desvendar a verdade!
Entra TIRÉSIAS, velho e cego, guiado por um menino. Escoltam-no dois servidores de ÉDIPO. EDIPO: Ó Tirésias, que conheceis todas as coisas, tudo o que se possa averiguar, e o que deve permanecer sob mistério; os signos do céu e os da terra… Embora não vejas, tu sabes do mal que a cidade sofre; para defendê-la, para salvá-la, só a ti podemos recorrer, ó Rei!” Apolo, conforme deves ter sabido por meus emissários, declarou a nossos mensageiros que só nos libertaremos do flagelo que nos maltrata se os assassinos de Laio forem descobertos nesta cidade, e mortos ou desterrados. Por tua vez, Tirésias, não nos recuses as revelações oraculares dos pássaros, nem quaisquer outros recursos de tua arte divinatória; salva a cidade, salva a ti próprio, a mim, e a todos, eliminando esse estigma que provém do homicídio. De ti nós dependemos agora! Ser útil, quando para isso temos os meios e poderes, ë a mais grata das tarefas!
TIRÉSIAS: Oh! Terrível coisa é a ciência, quando o saber se toma inútil! Eu bem assim pensava; mas creio que o esqueci, pois do contrário não teria consentido em vir até aqui.
ÉDIPO Que tens tu, Tirésias, que estás tão desalentado?
TIRÉSIAS Ordena que eu seja reconduzido a minha casa, ó rei. Se me atenderes, melhor será para ti, e para mim.
ÉDIPO Tais palavras, de tua parte, não são razoáveis, nem amistosas para com a cidade que te mantém, visto que lhe recusas a revelação que te solicita.
TIRÉSIAS Para teu benefício, eu bem sei, teu desejo é inoportuno. Logo, a fim de não agir imprudentemente…
ÉDIPO Pelos deuses! Visto que sabes, não nos ocultes a verdade! Todos nós, todos nós, de joelhos, te rogamos!
TIRÉSIAS Vós delirais, sem dúvida! Eu causaria a minha desgraça, e a tua!
ÉDIPO Que dizes?!… Conhecendo a verdade, não falarás? Por acaso tens o intuito de nos trair, causando a perda da cidade?
TIRÉSIAS Jamais causarei tamanha dor a ti, nem a mim! Por que me interrogas em vão? De mim nada ouvirás!
Para quem nunca leu teatro, vale observar as indicações das ações previstas para a cena. Estas indicações cênicas (também chamadas de rubricas ou didascálias) são informações que o dramaturgo escreve sobre as ações previstas para uma montagem teatral.
Outro aspecto que pode passar desapercebido é a existência do Coro, que neste pequeno trecho tem apenas uma fala. O Coro é uma presença constante nas peças gregas, com a função de comentar o que já ocorreu ou o que ainda está por vir. O Coro, que pode parecer pouco importante, é a origem do teatro grego, mas disso falarei em outro post.
Sendo uma tragédia, sabemos que final feliz não haverá! Mas o que interessa nesta leitura não é a alegria ou o perdão, já que nada disso ocorre, mas sim a dor vivida por este homem que se apaixona pela própria mãe, sem saber que era seu filho, colocando em desgraça não apenas a própria vida, mas a de sua mãe e dos filhos gerados por esse casal incestuoso.
Se você se apaixonar, como eu, por este texto, poderá ler toda a trilogia, que continuará com Édipo em Colono e Antígona.
Para quem se interessou, o texto está disponível em http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/cv000024.pdf