A Trágica História do Rei Édipo

Assisti esta peça no Sesc Jundiaí, dia 28 de setembro, um dia depois de sua estreia.

Quando a peça começou gostei tanto dos figurinos, que pensei que seria o que mais me encantaria em toda a montagem! Eles são lindos  e permitem um olhar para as personagens, especialmente para o coro, que mistura a tragicidade deste texto com o fato de serem pessoas da cidade de Tebas. As máscaras permitem que você descubra quão significativo pode ser este recurso na criação de um personagem.

Eu adoro este texto, foi o que eu escolhi para estreia aqui no blog da aba dramaturgia, onde comento diferentes textos teatrais, veja em http://teatronasaladeaula.com.br/dramaturgia/. Assistir uma montagem de Édipo é sempre um risco, risco de não alcançar a potência do texto, risco de não ser tão boa quanto outras já vistas.

Esta me cativou logo de cara com os figurinos, o jogo de luz foi o segundo aspecto que me permitiu adentrar as cenas e já seria o bastante para recomendar que você saia de casa para ir ao teatro!

Mas as cenas finais emocionaram! Tanto Jocasta (interpretada por Victória Camargo), como Édipo (interpretado por Felipe Hofstatter) dão conta da contundência deste momento tão trágico que é a descoberta de Édipo sobre si mesmo.

As fotos deste post são de André Leão, disponíveis em https://www.facebook.com/praxisreligarte/

Se você não conhece o texto, leia! Se você nunca viu esta peça montada, não perca a chance. Não fosse está uma postagem curta, eu poderia falar sobre o Tirésias e o menino, que fazem um jogo no qual os dois se amalgamam ou sobre a menina do coro que canta lindamente. Se quiser saber mais, não perca a próxima apresentação. Para conhecer sobre o trabalho do grupo, entre em https://www.facebook.com/praxisreligarte/

 

Cia. De Teatro Práxis-ReligArte

Adaptação e Direção: Alexandre Ferreira

Cenário, Figurino e Adereços: Juliana Fernandes e Vinícius Ribela

Iluminação: José Luiz Fagundes

Sonoplastia: Alexandre Ferreira

Dramaturgia: Édipo Rei

Escolhi como texto para este primeiro post uma peça pela qual me apaixonei enquanto lia. A história é bastante conhecida e muitas montagens já foram feitas dela, afinal, é um dos mais antigos registros de textos teatrais da história ocidental.

Édipo Rei foi escrito por Sófocles por volta de 427 a.C., na Grécia Antiga. É parte de uma trilogia, isto é, três peças que se relacionam, embora seja possível compreender cada uma delas em separado.

A linguagem utilizada pode soar estranha quando começamos a ler, mas conforme seguimos, a história nos envolve de tal forma, que a maneira pela qual foi escrita deixa de ser uma dificuldade. Mas quem nunca leu um texto antigo precisa insistir, pois demora um pouco para engrenar.

De forma muito resumida, podemos dizer que nesta história Édipo mata seu pai e se apaixona por sua mãe, Jocasta, casando-se com ela. Mas o que interessa, como sempre acontece com as boas histórias, é como isso aconteceu. Na leitura do texto podemos acompanhar todo o sofrimento de Édipo e de Jocasta na busca da verdade da história da vida deles, e após sua descoberta, o terror que sentem por terem cometido  ato tão pavoroso quanto o incesto de mãe e filho.

Um dos personagens centrais desta peça é Tirésias, o profeta que irá ajudá-los nesta descoberta avassaladora. Podemos ler um pequeno trecho do diálogo de Tirésias com Édipo.

O CORO: Acaba de chegar quem tudo nos vai descobrir! Trazem aqui o divino profeta, o único, entre todos os homens, que sabe desvendar a verdade!

Entra TIRÉSIAS, velho e cego, guiado por um menino. Escoltam-no dois servidores de ÉDIPO. EDIPO: Ó Tirésias, que conheceis todas as coisas, tudo o que se possa averiguar, e o que deve permanecer sob mistério; os signos do céu e os da terra… Embora não vejas, tu sabes do mal que a cidade sofre; para defendê-la, para salvá-la, só a ti podemos recorrer, ó Rei!” Apolo, conforme deves ter sabido por meus emissários, declarou a nossos mensageiros que só nos libertaremos do flagelo que nos maltrata se os assassinos de Laio forem descobertos nesta cidade, e mortos ou desterrados. Por tua vez, Tirésias, não nos recuses as revelações oraculares dos pássaros, nem quaisquer outros recursos de tua arte divinatória; salva a cidade, salva a ti próprio, a mim, e a todos, eliminando esse estigma que provém do homicídio. De ti nós dependemos agora! Ser útil, quando para isso temos os meios e poderes, ë a mais grata das tarefas!

TIRÉSIAS: Oh! Terrível coisa é a ciência, quando o saber se toma inútil! Eu bem assim pensava; mas creio que o esqueci, pois do contrário não teria consentido em vir até aqui.

ÉDIPO Que tens tu, Tirésias, que estás tão desalentado?

TIRÉSIAS Ordena que eu seja reconduzido a minha casa, ó rei. Se me atenderes, melhor será para ti, e para mim.

ÉDIPO Tais palavras, de tua parte, não são razoáveis, nem amistosas para com a cidade que te mantém, visto que lhe recusas a revelação que te solicita.

TIRÉSIAS Para teu benefício, eu bem sei, teu desejo é inoportuno. Logo, a fim de não agir imprudentemente…

ÉDIPO Pelos deuses! Visto que sabes, não nos ocultes a verdade! Todos nós, todos nós, de joelhos, te rogamos!

TIRÉSIAS Vós delirais, sem dúvida! Eu causaria a minha desgraça, e a tua!

ÉDIPO Que dizes?!… Conhecendo a verdade, não falarás? Por acaso tens o intuito de nos trair, causando a perda da cidade?

TIRÉSIAS Jamais causarei tamanha dor a ti, nem a mim! Por que me interrogas em vão? De mim nada ouvirás!

Para quem nunca leu teatro, vale observar as indicações das ações previstas para a cena. Estas indicações cênicas (também chamadas de rubricas ou didascálias) são informações que o dramaturgo escreve sobre as ações previstas para uma montagem teatral.

Outro aspecto que pode passar desapercebido é a existência do Coro, que neste pequeno trecho tem apenas uma fala. O Coro é uma presença constante nas peças gregas, com a função de comentar o que já ocorreu ou o que ainda está por vir. O Coro, que pode parecer pouco importante, é a origem do teatro grego, mas disso falarei em outro post.

Sendo uma tragédia, sabemos que final feliz não haverá! Mas o que interessa nesta leitura não é a alegria ou o perdão, já que nada disso ocorre, mas sim a dor vivida por este homem que se apaixona pela própria mãe, sem saber que era seu filho, colocando em desgraça não apenas a própria vida, mas a de sua mãe e dos  filhos gerados por esse casal incestuoso.

Se você se apaixonar, como eu, por este texto, poderá ler toda a trilogia, que continuará com Édipo em Colono e Antígona.

Para quem se interessou, o texto está disponível em http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/cv000024.pdf