Apropriação do texto pelos alunos-atores

Como um ator, uma atriz ou um aluno de teatro aprende um texto para que seja dito em cena?

Assim como quase tudo na vida, não existe uma única maneira.

Foto de Ike louie Natividad no Pexels

A forma que muita gente deve ter feito em suas aulas de teatro e principalmente, em suas apresentações teatrais feitas na escola, sem que para isso houvesse aulas de teatro, foi decorando o texto e depois torcendo para não esquecer.

O termo decorar segundo alguns dicionários etimológicos significa passar pelo coração, porém o Blog do Fernando atribui tal termo a origem fenícia e não latina, na qual a relação está com saber de memória.

Ainda que a origem da ação de decorar possa estar fundamentada no passar pelo coração, a prática de decorar é muitas vezes vivida como um memorizar sem sentido. E não há nada mais distante do trabalho do ator, do que falar um texto sem sentido.

Tendo isto em mente, podemos pensar diferentes estratégias para que o texto faça sentido para quem irá representá-lo.

É possível fazer uma abordagem mais teórica, na qual o texto é lido e estudado tendo em vista os conceitos e conflitos apresentados.

Por exemplo, se eu escolho representar uma peça de Bertold Brecht, poderei estudar o momento no qual ela foi escrita, o que ocorria na época, os valores de Brecht sobre a sociedade, a política, o papel do teatro e as relações sociais, dentre outros aspectos que podem ser considerados em seu trabalho.

Também é possível fazer uma apropriação do texto que se dê pela sonoridade das palavras, de tal maneira que vou experimentar o som das frases, as diferentes formas de dizê-las e buscar na experimentação sonora relacionada ao gestual, identificar o sentido e fazer escolhas sobre como encenar o texto escolhido.

A apropriação pode ser feita em um movimento de aproximações diversificadas, no qual faço improvisações sobre o texto, em paralelo a conversas sobre o sentido que o texto teve, tanto por quem o escreveu, como para o grupo que irá representa-lo e desta maneira serão feitas escolhas sobre a maneira de que o texto se torne cena e fala.

Seja qual for a escolha feita, é fundamental que o texto seja aprendido ou decorado, como algo que tenha passado pelo coração, algo que faça sentido para as pessoas que o representam e possa, no momento da apresentação, ganhar sentido também para o público que o assiste.

Alunos em cena: jogando com texto

Para quem?

Todas as idades, desde que saibam ler com fluência.

Condições necessárias

Uma sala que permita movimento, de preferência sem muito barulho.

Materiais necessários

Cópias de um mesmo trecho de um texto teatral.

Como acontece?

Entregue uma folha para cada aluno com um trecho de uma peça teatral reproduzido em um tamanho de letra que seja possível ler se movimentando.

Proponha que todos leiam o texto diversas vezes, caminhando pela sala. Esta primeira leitura tem o objetivo de que o grupo conheça o texto e entenda o que está falando.

Peça que cada aluno escolha uma frase do texto e repita-a diversas vezes com intenções variadas, explorando as diferentes maneiras de dizer este mesmo trecho.

Faça uma roda e proponha que o texto seja dito por todos, cada um falará uma frase, buscando variedade na maneira de falar.

Para fazer antes

Proponha um aquecimento vocal, no qual os alunos irão explorar a projeção de voz, o ritmo da fala, a altura – mais grave ou mais agudo – e o volume alto ou baixo. Também é importante usar os intervalos da fala, brincar com a respiração e com as muitas maneiras de falar que temos.

Para fazer depois

Divida o grupo conforme o número de personagens da cena escolhida e proponha que apresentem esta cena uns para os outros. Será interessante observar como a forma de falar irá interferir na encenação e no sentido que o texto pode ganhar.

Como escolher um texto?

No ensino de teatro é muito difícil escolher um texto para montar uma peça com os alunos, sejam da idade que forem!

Talvez a principal dificuldade seja do número de alunos em contraposição ao número de personagens. Quase todas as peças tem poucos personagens e quase todas as salas de aula tem muitos alunos. É uma conta que não fecha!

A situação só piora quando observamos o número de personagens que tem alguma importância no enredo. Dois exemplos clássicos de montagens feitas na Educação Infantil e nos primeiros anos do Fundamental: Os três porquinhos – 4 personagens e Chapeuzinho Vermelho – 5 personagens.

Os poucos alunos considerados capazes irão fazer alguns destes personagens. Para os demais sobram as árvores, os pássaros, os bichinhos da floresta ou alguma invenção humana feita pela professora.

A tentativa de encaixar uma turma de 25 alunos em uma apresentação com 5 personagens, quase nunca funciona. Alunos chateados, irrequietos e que chegam a conclusão de que fazer teatro é muito chato!

Como fazer? Mudar a forma de pensar texto para alunos pequenos. Buscar personagens coletivos. Buscar histórias nas quais muitos personagens interajam. Fazer com que várias crianças interpretem o mesmo personagem.

É possível encontrar diferentes soluções, o que fundamenta a busca é ter claro que o mais importante na apresentação é possibilitar a criação cênica com o corpo e com a voz, portanto a escolha do texto e as opções sobre como apresentar não podem colocar o texto na frente das crianças.