A vida de William Shakespeare

A peça que vou comentar hoje é da Cia. Vagalum Tum Tum e eu assisti no Festival “A gente que fez”, que é um festival onde crianças prepararam o festival para crianças. Vale muito a pena acompanhar a programação do festival, mas isto é assunto para outro post!

Imagem retirada de @catarsisproducoes

Podemos conhecer um pouco da história da companhia no seu site e peguei um trecho desta história para colocar aqui: “A Cia. Vagalum Tum Tum foi fundada em 2001 por Ângelo Brandini e Christiane Galvan, com a proposta de pesquisar as técnicas do palhaço inseridas no cotidiano contemporâneo e o olhar deste arquétipo para adaptar as histórias de William Shakespeare para crianças e jovens. Nestes 19 anos de história desenvolvemos uma linguagem própria e original construída através da diversidade de conhecimento de cada profissional que trabalha conosco, vindos do teatro, do circo, da música e a condução artística do trabalho feita pelo diretor e dramaturgo Angelo Brandini, que tem ampla formação nas áreas citadas.”

“A Vida de William Shakespeare” é uma série, algo que podemos chamar de teatro nesta pandemia na qual não podemos estar no mesmo espaço físico que atores e demais pessoas da plateia, mas podemos estar no mesmo espaço virtual.

Nesta apresentação o que mais fazemos é nos divertir! A forma pela qual a vida do Wil, apelido dado ao famoso Shakespeare, é contada, diverte e informa. Não importa que você já saiba tudo sobre esta pessoa que viveu há tanto tempo e que escreveu tantas peças famosas, porque o bom mesmo é ver as caras e caretas feitas pela Christiane Galvan para explicar o que acontece nesta longa história.

A leveza com que o grupo se remete às tragédias, os recursos lúdicos utilizados demonstram que é um grupo que sabe quem são as crianças, respeitando suas características e sua inteligência.

Assistir online e poder conversar com a dupla de atores, junto com uma plateia cheia de crianças equilibrou a ausência do calor do teatro cheio, me diverti muito com a apresentação e com os comentários depois. Quer ver, hoje você ainda consegue, mas corre!!! Para informações e acesso sobre o festival, acesse aqui.

Caso você não tenha visto no festival, poderá acompanhar os episódios, será lançado um por semana, toda quinta as 19h! A estréia será no dia 18/03, no youtube da Cia. Vagalum Tum Tum.

A maquiagem na cena

A maquiagem é um dos elementos da cena teatral menos considerado e pode fazer uma mudança muito grande na criação de um personagem.

Estamos acostumadas a fazer maquiagem em situações cotidianas, principalmente as mulheres e esta maquiagem tem uma função muito diferente da maquiagem teatral, já que, de maneira geral, a maquiagem utilizada cotidianamente tem a função de corrigir defeitos da pele e ressaltar características, sempre buscando a beleza. Ainda que os padrões de beleza possam variar no tempo e no espaço, a função da maquiagem cotidiana permanece esta, responder a um padrão estético.

Foto de Laura Garcia no Pexels

A maquiagem teatral busca algo muito diferente disso, já que o que se pretende com a maquiagem é a criação do personagem, a definição de suas características e uma melhor composição de sua apresentação.

A maquiagem é uma forte aliada no trabalho do ator/atriz para que estes possam entender melhor as possibilidades de sua atuação.

Uma forma de entender este conceito é pensar em situações nas quais você faz uma maquiagem especial e se sente melhor preparada para ir a um evento, uma festa ou um baile de carnaval. Para os homens que não usam maquiagem, é possível que fazer a barba ou arrumar o cabelo deem esta mesma sensação.

Mas como usar a maquiagem no trabalho com crianças? Esta resposta você vai receber no próximo post!

O Jogo do Cenário

Para quem?

Pessoas com mais de 5 anos.

Condições necessárias:

Uma sala que permita movimento.

Materiais necessários:

Cubos grandes ou cadeiras ou caixas ou tecidos.

Como acontece?

Este jogo se propõe a criar cenários com objetos que possam configurar o espaço de diferentes maneiras. Estes objetos podem ser cubos de madeira, que suportem o peso dos alunos, ou caixas ou cadeiras.

Caso esta proposta seja feita com crianças pequenas, o objeto a ser manipulado deverá ser em um formato ou peso que a criança possa carregar, sem se machucar. Neste caso será melhor o uso de caixas vazias ou tecidos.

Defina uma sequencia de cenas que aconteçam em diferentes espaços, pode ser por exemplo:

  • A personagem está em seu quarto lendo;
  • Sai de casa e fica no portão procurando seu irmão que não respondeu;
  • Anda por uma avenida muito movimentada procurando-o;
  • Chega a uma praça tranquila onde ele está jogando bolinha de gude com três amigos.

Estabelecida a sequencia de cenas, peça para o grupo de alunos criar estes espaços com os objetos disponíveis, se forem os cubos, eles se movimentarão para transformar o lugar da cena, o mesmo acontecerá para as cadeiras, caixas ou tecidos.

Veja estas três fotos e os diferentes significados que os cubos ganharam, na primeira imagem os cubos formaram uma ponte de cristal, na segunda um nicho e na terceira o parapeito de uma janela:

        

Esta proposta busca a compreensão de como podemos criar cenários com a utilização variada de um mesmo objeto.

É importante ressaltar que esta concepção de cenário não busca uma criação realista, mas sim uma compreensão de que os objetos podem ganhar significados distintos conforme sua disposição.

Para saber mais

Procure observar cenários de diferentes montagens e ter inspiração sobre diferentes maneiras de utilizar os objetos. Você poderá ler mais sobre o papel do cenário nos dois posts aqui neste blog: Qual o papel do cenário e Mudando o cenário.

Também vale a pena conhecer o trabalho de importantes cenógrafos brasileiros, como JR Serroni, Gianni Ratto ou Daniela Thomas, dentre muitos outros.

Mudar cenários

A mudança de um cenário no meio de uma montagem pode ser um problema grande para ser resolvido, pois se não temos um palco giratório que usa do intervalo para trazer para diante do público um novo cenário, certamente esta mudança pode ser algo bem cansativo.

Não conheço nenhum espaço educativo que tenha um palco giratório. São poucos os teatros no mundo que possuem palcos giratórios, com a opção de mais de um cenário! Mas esta imagem abaixo é de um pequeno palco giratório, em uma apresentação da Companhia Le Plat du Jour.

Dificilmente precisaremos de uma condição tão complexa como esta para alterar um cenário de uma peça, portanto vamos pensar nos diferentes tipos de cenário e como estas modificações podem ser feitas.

O que é necessário ter como princípio é que tudo o que é feito de forma a interromper a cena, faz com que a apresentação se torne mais cansativa, portanto, o melhor é que a mudança de cenário seja feita pelos próprios atores e atrizes que poderão levar e trazer objetos ou mobiliários como parte da própria cena.

Evidentemente se a tua opção é um cenário realista, cheio de detalhe, o ideal é que você divida o palco em dois e cada cenário fique permanentemente montado, fazendo uso da iluminação para a mudança da cena.

Cenários feitos com painéis

No caso de cenários nos quais apenas um painel situa o local da cena, na ausência de um sistema de roldanas que troque um painel por outro, o painel pode ser trocado pro pessoas de apoio ou pelos próprios atores. E no formato de biombo, como desta apresentação da Cia Le Plat du Jour, o cenário pode ser montado e desmontado em qualquer espaço.

Cenários com objetos de múltiplos significados

Se você tiver um cenário feito de cubos ou de objetos que podem ganhar diferentes significados, como uma mesa, os atores podem alterar a disposição dos móveis ou alterar algum objeto que simbolize a mudança de cenário, por exemplo:

  • No caso de cubos, eles podem ser empilhados de forma a criarem um muro em cena ou dispostos de forma horizontal para se transformarem em cama ou mesa.
  • Uma mesa poderá ser a mesa de um escritório com um computador sobre ela e de uma casa, com um vaso de flor ou uma fruteira.

São muitas as maneiras de transformar o palco e adequar os cenários, mas em todas elas é necessário ter clareza de que o cenário existe para compor a cena e que a peça não poderá ser interrompida a todo momento para a modificação do cenário.

Qual é a música?

Para quem?

Pessoas com mais de 5 anos.

Condições necessárias:

Uma sala que permita movimento.

Materiais necessários:

Aparelho de som com diferentes sons e músicas.

Como acontece?

Esta proposta pode ser feita como um exercício de improvisação ou como parte da construção de um personagem dentro da montagem de uma peça teatral.

A primeira coisa a fazer é definir qual a personagem que cada aluno irá representar e saber quais as características desta personagem.

Após esta definição, crie ações básicas e cenas curtas para que a personagem possa improvisar. Podemos considerar ações básicas:

Caminhar

Comer

Trocar de roupa

Dormir

Tomar banho

 

As cenas curtas dependem da personagem, mas pode ser:

  • Um almoço de trabalho ou de estudo
  • Uma conversa ou uma briga com alguém
  • Um momento de compra em uma loja qualquer
  • Participando de um jogo

As ações básicas, assim como as cenas curtas serão feitas com diferentes músicas, de tal forma que a música auxilie o aluno a identificar as características e a maneira de agir da personagem.

Música da personagem

Você tem uma música tema para você? Pergunta difícil, né?

Talvez você tenha uma música tema para uma fase de tua vida, quem sabe uma música que te acompanha em muitos momentos.

Foto de VisionPic .net no Pexels

A música tema de um personagem pode ser utilizada com diferentes propostas. Pode ser uma maneira de caracterizar a personagem, então se é uma personagem romântica, terá uma música tema romântica nos momentos que ela aparece em cena.

Também pode ser uma música para marcar um tipo de ação. Esta escolha é bastante comum no teatro infantil, utilizando-se de repetições sonoras ou musicais para marcar a repetição da entrada de uma personagem, por exemplo: sempre que o lobo aparece, uma mesma música é tocada.

A música tema também poderá ser usada somente em alguns momentos de atuação da personagem, já que se espera que qualquer personagem passe por diferentes emoções no decorrer de uma peça, neste caso, a música tema pode ter relação com a principal característica da personagem, por exemplo:

  • A personagem é uma moça gentil e delicada, então a música escolhida como música tema remete a estas características. Porém no momento que ela está brigando com sua irmã, a música não tocará.
  • O personagem é um coelho muito ligeiro e sua música tema é em um ritmo bem veloz, porém no momento que ele dorme e não vê suas roupas serem roubadas, não tocará a música tema.

A escolha de música tema é uma possibilidade, mas está longe de ser uma obrigatoriedade. Muitas montagens não se utilizam deste recurso e muitas sonoplastias são feitas inclusive sem música.

Vale a pena utilizar este recurso quando a peça pede por isso e, também pode ser utilizado como parte da caracterização da personagem, mesmo que depois não se utilize na apresentação.

Sons do ambiente

O ambiente no qual vivemos está repleto de sons. Os sons do nosso cotidiano variam de acordo com o lugar onde vivemos, com o espaço onde estamos e com o horário do dia ou da noite.

Quando pensamos na situação fictícia que é a da cena teatral, podemos optar por reproduzir a sonoridade realista, reproduzindo com a maior fidelidade possível o espaço ficcional que está sendo representado ou não.

A escolha por fazer uma cena realista está centrada na concepção de teatro que acreditamos e na função social do teatro.

Podemos nos utilizar dos sons de maneira a criar um espaço imaginário, recurso muito utilizado quando os espaços representados são difíceis de serem criados com o cenário, por exemplo:

A cena se passa em uma floresta e a montagem não possuí recursos para a criação de um cenário realista de floresta. Desta maneira o som pode criar o reconhecimento espacial.

Também é possível a utilização de sons que remetem ao ambiente, porém de maneira distorcida, para criar um efeito dramático, por exemplo:

  • Um gigante se aproxima e o som de seus passos é altíssimo, muito mais alto do que seria, caso gigantes andassem por aí!
  • Um trem está quase atropelando uma personagem e o som do trem também é aumentado, para criar uma enorme expectativa. Na sequência o som do trem pode ser abaixado drasticamente e ouviremos apenas o grito da personagem, quando se depara com seu atropelamento iminente.

O que percebemos com as escolhas sonoras para a cena é que elas poderão ou não reproduzir o ambiente representado, mas sempre teremos que escutar quais são os sons que estão no nosso imaginário!

Encontrando um clima

Foto de Vova Krasilnikov no Pexels

 

 

 

Para quem?

Pessoas com mais de 5 anos.

Condições necessárias:

Uma sala que permita movimento.

Materiais necessários:

Aparelho de som com diferentes sons e músicas.

 

 

 

Como acontece?

Escolha uma cena com duas pessoas conversando. É possível partir de uma cena já escrita ou de um tema para uma conversa, como por exemplo:

  • Duas amigas decidindo para onde irão viajar nas férias
  • Um casal de namorados conversando sobre um filme que acabaram de assistir
  • Um pai e uma filha conversando sobre as notas que ela teve na escola.

Proponha uma improvisação para uma destas cenas e escolha três músicas muito diferentes para tocarem durante a cena. Além de música, é possível também colocar um ruído ou um som, como o som de uma tempestade, o barulho de uma britadeira ou uma buzina muito alta.

Observe como o som interfere na cena, qual o clima que ele promove e se altera o desenrolar das ações e dos diálogos.

Caso vocês escolham fazer este exercício com uma cena que já esteja escrita, não será possível observar alterações na fala, porém a intensão do que está sendo dito pode ser modificada pela maneira como o texto será dito.

Que horas são?

Foto de Andrey Grushnikov no Pexels

Para quem?

Qualquer pessoa que reconheça os horários do dia.

Condições necessárias:

Uma sala que permita movimento.

Materiais necessários:

Nenhum

Como acontece?

Escreva em um pedaço de papel diferentes horários do dia e da noite, que podem ser horas de relógio ou momentos relacionados ao horário, como: hora do almoço, começo da madrugada, ao amanhecer, etc.

Divida os alunos em pequenos grupos e peça que cada um escolha um dos papeis com um horário definido. Cada aluno irá escolher uma ação que permita à plateia identificar qual o horário sorteado por ele/ela. Embora estejam em pequenos grupos, esta atividade é individual e pode ser feita com uma pessoa por vez, porém caso seja um grupo de alunos muito grande, será cansativo fazer com um de cada vez.

Posicione o grupo em uma relação de palco e plateia. Para isso não é necessário ter um espaço com um palco construído, basta que seja estabelecido qual o lugar do palco e da plateia na sala de aula.

Depois que todos tiverem feito a proposta individualmente, agrupe-os em quartetos ou quintetos e peça que escolham ou sorteiem novamente um horário, porém desta vez todos irão estar na mesma cena, no horário escolhido.

As cenas serão definidas parcialmente, definindo quem eles são, onde estão e qual o motivo para estarem naquele horário juntos. O restante será improvisado. Por exemplo:

  1. Um grupo de vizinhos na rua, no meio da madrugada, porque um motorista bateu o carro no portão de uma das casas, derrubando-o.
  2. Uma família almoçando, às 13h.

Após a improvisação das cenas, os comentários poderão observar o quanto os horários ficaram evidentes.

Para fazer mais

É possível dar continuidade a esta proposta, associando uma emoção ao horário, nos papeis sorteados, tanto para o que será feito individualmente, como em grupo.

OBS: Esta proposta partiu do jogo homônimo proposto por Viola Spolin.

Dois perdidos numa noite suja

Montagem com Plínio Marcos

“Escrita e estreada em 1966, em São Paulo, no Bar Ponto de Encontro, transferindo-se em seguida para o Teatro de Arena, SP. Estreia no Rio de Janeiro em 1967.Na temporada no Teatro de Arena, SP, em 1967, Ademir Rocha foi substituído por Berilo Faccio. Ainda nesse ano, a mesma montagem se apresentou no Teatro da Rua (Rua Augusta, 2203, SP), como a primeira parte de um programa duplo, cuja segunda parte era Zoo Story, de Edward Albee. DOIS PERDIDOS NUMA NOITE SUJA é uma das peças mais montadas do autor. Foi também encenada na França, na Alemanha, na Inglaterra, nos Estados Unidos, em Cuba, além de adaptações para  cinema.”

Esta explicação sobre a peça, assim como outras sobre a obra de Plínio Marcos pode ser vista no site www.pliniomarcos.com.

A Enciclopédia do Itaú Cultural define o autor da seguinte forma: Plínio Marcos de Barros (Santos, São Paulo, 1935 – São Paulo, São Paulo, 1999). Autor. Renovador dos padrões dramatúrgicos, através de enfoque quase naturalista que imprime aos diálogos e situações, sempre cortantes e carregados de gírias de personagens oriundas das camadas sociais periféricas, torna o palco, a partir dos anos 1960, uma feroz arena de luta entre indivíduos sob situações de subdesenvolvimento.

Esta peça é um permanente embate. Os dois personagens Tonho e Paco nos colocam perante o sofrimento da miséria que só vai se intensificando com o decorrer das cenas. A miséria apresentada por Plínio Marcos não é somente a falta de dinheiro, mas falta possibilidades, falta educação, falta sonhos, falta afeto.

O que vemos de sobra é a capacidade do autor em lidar poeticamente com este mundo para o qual pouco se quer olhar e menos ainda viver, mas um espaço que ainda permanece nos cortiços e barracos de nosso país.

Leia o começo da peça para aguçar tua vontade de continuar:

Montagem do grupo gaúcho de teatro Loucos de Palco

Um quarto de hospedaria de última categoria, onde se vêem duas camas bem velhas, caixotes improvisando cadeiras, roupas espalhadas etc.

Nas paredes estão colados recortes, fotografias de time de futebol e de mulheres nuas.

I ATO

Primeiro Quadro

(Paco está deitado em uma das camas. Toca muito mal uma gaita. De vez em quando, pára de tocar, olha para seus pés, que estão calçados com um lindo par de sapatos, completamente em desacordo com sua roupa. Com a manga dó paletó, limpa dos sapatos. Paco está tocando, entra Tonho, que não dá bola para Paco. Vai direto para sua cama, senta-se nela e, com as mãos, a examina.)

TONHO

Ei! Pára de tocar essa droga. (Paco finge que não houve.)

TONHO

(Gritando.) Não escutou o que eu disse? Pára com essa zoeira!

(Paco continua a tocar.)

TONHO

É surdo, desgraçado? (Tonho vai até Paco e o sacode pelos ombros.)

TONHO

Você não escuta a gente falar?

PACO

(Calmo.) Oi, você está aí?

TONHO

Estou aqui para dormir.

PACO

E daí? Quer que eu toque uma canção de ninar?

TONHO

Quero que você não faça barulho.

PACO

Puxa! Por que?

TONHO

Porque eu quero dormir.

PACO

Ainda é cedo.

TONHO

Mas eu já quero dormir.

PACO

Mas não vai conseguir.

TONHO

Quem disse que não?

PACO

As pulgas. Essa estrebaria está assim de pulgas.

TONHO

Disso eu sei. Agora quero que você não me perturbe.

PACO

Poxa! Mas o que você quer?

TONHO

Só quero dormir.

PACO

Então pára de berrar e dorme.

TONHO

Está bem. Mas não se meta a fazer barulho. (Tonho volta para sua cama, Paco recomeça a tocar.)

TONHO

Pára com essa música estúpida! Não entendeu que eu quero silêncio?

PACO

E daí? Você não manda.

TONHO

Quer encrenca? Vai ter! Se soprar mais uma vez essa droga, vou quebrar essa porcaria.

PACO

Estou morrendo de medo.

TONHO

Se duvida, toca esse troço. (Paco sopra a gaita, Tonho pula sobre Paco. Os dois lutam com violência. Tonho leva vantagem e tira a gaita de Paco.)

PACO

Filho-da-puta!

TONHO

Avisei, não escutou, se deu mal.

PACO

Dá essa gaita pra cá.

TONHO

Vem pegar.

PACO

Poxa! Deixa de onda e dá essa merda.

TONHO

Se tem coragem, vem pegar.

PACO

Pra que fazer força? Você vai ter que dormir mesmo.

TONHO

Antes de dormir, jogo essa merda na privada e puxo a bomba.

PACO

Se você fizer isso, eu te apago.

TONHO

Experimenta.

PACO

Se duvida, joga.

TONHO

Jogo. E daí?

PACO

Então joga.

TONHO

Você só tem boca-dura.

PACO

É melhor você me dar essa merda.

TONHO

Não enche o saco.

PACO

Anda logo. Me dá isso.

TONHO

Não vou dar. (Paco pula sobre Tonho. Esse mais uma vez leva vantagem. Joga Paco longe com um empurrão.)

TONHO

Tá vendo, palhaço? Comigo você só entra bem.

PACO

Eu quero minha gaita.

TONHO

Não tem acordo (Pausa)

(Tonho deita-se e Paco fica onde está, olhando Tonho.)

TONHO

Vai ficar aí me invocando?

PACO

Já estou invocado há muito tempo.

TONHO

Poxa! Vê se me esquece, Paco.

PACO

Então me dá a gaita.

TONHO

Você não toca?

PACO

Não vou tocar.

TONHO

Palavra?

PACO

Juro.

TONHO

Então toma. (Tonho joga a gaita na cama de Paco.) Se tocar, já sabe. Pego outra vez e quebro.

(Paco limpa a gaita e a guarda. Olha o sapato, limpa-o com a manga do paletó.)